STJ – Substituições Testamentárias (simples, recíproca ou fideicomisso)

Conforme ensinamentos dos Professores Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim*, o Código Civil Brasileiro trata da Substituição Testamentária nos Arts. 1.947 a 1.960, prevendo três espécies de substituição testamentária:

a) Substituição simples ou vulgar, que pode ser singular ou coletiva, conforme sejam nomeadas uma ou mais pessoas para recebimento da cota vaga (exemplo: legado em favor de A, ou, na sua falta, de B, ou de B e C);

b) Substituição recíproca, quando os substitutos sejam os próprios herdeiros ou legatários nomeados para certos bens ou conjuntamente (exemplo: legado de uma casa em favor de A e de outra em favor de B, sendo que cada um substituirá o outro que faltar);

c) Substituição fideicomissária, mediante a instituição do fideicomisso (exemplo: legado de um imóvel em favor de A, para que, depois de sua morte, certo tempo ou condição, transmita-se a propriedade do bem para B).

Note-se que a substituição pode ainda ser “compendiosa“, quando contenha várias disposições, abrangendo, além do fideicomisso, também substituição simples ou recíproca do fiduciário ou do fideicomissário (ex: legado de imóvel para A, para que depois de sua morte se transmita a B, ou, na sua falta, para C).

Também, segundos os doutos, a extinção do fideicomisso, com a transmissão dos bens ao fideicomissário, pode ser requerida ao mesmo juiz do inventário, processando-se os autos apensados. Basta que se comprove o motivo: morte do fiduciário, decorrência de certo prazo ou satisfação da condição prevista no testamento. Mas haverá necessidade de abertura de inventário, em caso de falecimento do fiduciário, se ele deixou os outros bens além da propriedade em fidúcia.

O mesmo se diga em caso de morte do fideicomissário antes do fiduciário, quando se consolida a favor deste a propriedade. Em uma e outra dessas situações, haverá necessidade de recolhimento da cota remanescente do imposto causa mortis (50%, para complementação de igual cota recolhida na transmissão inicial ao fiduciário).

… No caso concreto há apenas um fiduciário (a recorrente) e um grau de fideicomissário. Em nenhum momento se falou em fiduciários sucessivos, nem em beneficiários (fideicomissários) que se tornassem fiduciários de bens a serem transmitidos a outros beneficiários. O que houve, isso sim, foi a regular substituição de um dos sujeitos (no caso, o fideicomissário) em razão de sua morte, o que foi feito em conformidade com o Art. 1.729 do Código Civil de 1916…

DECISÃO

Vistos etc.

Trata-se de embargos de divergência opostos por A. L. R. H. contra acórdão proferido pela Quarta Turma do STJ (Min. Maria Isabel Gallotti) que deu provimento ao recurso especial interposto por N. P. A. S/A – N. e parcial provimento ao apelo da ora embargante.

O acórdão foi assim ementado:

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SUCESSÃO TESTAMENTÁRIA. FIDEICOMISSO. FIDEICOMISSÁRIO PREMORIENTE. CLÁUSULA DO TESTAMENTO ACERCA DA SUBSTITUIÇÃO DO FIDEICOMISSÁRIO. VALIDADE. COMPATIBILIDADE ENTRE A INSTITUIÇÃO FIDUCIÁRIA E A SUBSTITUIÇÃO VULGAR. CONDENAÇÃO DE TERCEIRO AFASTADA. EFEITOS NATURAIS DA SENTENÇA.

  1. Se as questões trazidas à discussão foram dirimidas pelo tribunal de origem de forma suficientemente ampla, fundamentada e sem omissões, deve ser rejeitada a alegação de contrariedade do Art. 535 do Código de Processo Civil.
  1. A sentença não prejudica direitos de pessoa jurídica que não foi citada para integrar a relação processual (CPC, Art. 472). Como ato estatal imperativo produz, todavia, efeitos naturais que não pode ser ignorados por terceiros.
  1. O recurso de apelação e a ação cautelar são instrumentos processuais distintos e visam a diferentes objetivos. O ajuizamento de ambos para questionar diferentes aspectos do mesmo ato judicial não configura preclusão consumativa a obstar o conhecimento da apelação.
  1. De acordo com o Art. 1.959 do Código Civil, “são nulos os fideicomissos além do segundo grau”. A lei veda a substituição fiduciária além do segundo grau. O fideicomissário, porém, pode ter substituto, que terá posição idêntica a do substituído, pois o que se proíbe é a sequência de fiduciários, não a substituição vulgar do fiduciário ou do fideicomissário.
  1. A substituição fideicomissária é compatível com a substituição vulgar e ambas podem ser estipuladas na mesma cláusula testamentária. Dá-se o que a doutrina denomina substituição compendiosa. Assim, é válida a cláusula testamentária pela qual o testador pode dar substituto ao fideicomissário para o caso deste vir a falecer antes do fiduciário ou de se realizar a condição resolutiva, com o que se impede a caducidade do fideicomisso. É o que se depreende do Art. 1.958 c.c. 1.955, parte final, do Código Civil.
  1. Recurso especial de N. P. A. S/A – N. a que se dá parcial provimento.
  1. Recurso especial de A. L. R. H. a que se dá parcial provimento.

Para demonstração do dissenso jurisprudencial, a embargante colaciona acórdão proferido pela Terceira Turma no julgamento do REsp. 820.814/SP (Min. Nancy Andrighi).

Intimados, os embargados apresentaram impugnação às fls. 1.790/1.805 (e-STJ).

É o relatório.

Passo a decidir.

Os embargos de divergência devem ser indeferidos.

Cumpre observar, de início, que, segundo entendimento da Corte Especial do STJ, “o Regimento Interno desta Corte, em seu Art. 266, § 3º, possibilita ao relator indeferir monocraticamente os embargos de divergência, ainda que tenham sido inicialmente admitidos” (AgRg nos EREsp 594.218/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, DJ de 08/11/2007).

Quanto ao mais, não há similitude fática e jurídica entre o julgado recorrido e o acórdão proferido pela 3ª Turma no julgamento do REsp 820.814/SP (Min. Nancy Andrighi).

No caso, o acórdão embargado, delimitando a controvérsia posta à julgamento, afirmou que “(…) a questão que se discute (…) é relacionada à validade de cláusula testamentária que determina a substituição do fideicomissário por seus dependentes no caso de vir este a falecer antes do fiduciário. Os autores da ação sustentam a validade da cláusula com base na parte final do Art. 1.735 do Código Civil de 1916. No entendimento da ré reconvinte, ao contrário, com o falecimento do fideicomissário, caducou o fideicomisso, tendo a propriedade plena se consolidado na pessoa da fiduciária, na forma do disposto no Art. 1.738 do Código Civil de 1916, regra legal que sustenta ser de ordem pública e ter sido violada pela cláusula testamentária, a qual seria, pois, nula”, sintetizando, adiante, que  “o que se pretendia com a ação, portanto, era a declaração da extinção do fideicomisso, pois o mais jovem herdeiro do fideicomissário morto atingiu a maioridade, termo imposto pela fideicomitente para que os substitutos do fideicomissário recebessem os bens fideicometidos” (e-STJ, fl. 816).

De outro lado, no REsp 820.814/SP (Min. Nancy Andrighi), a 3ª Turma apreciou pretensão de “(…) ter declarada a capacidade sucessória passiva para figurar como herdeiro legítimo do irmão falecido, em iguais condições e ao lado dos demais irmãos, considerada a caducidade da substituição fideicomissária anteriormente instituída pelo avô em favor dos netos, excluído o recorrente porque ainda não nascido por ocasião da abertura da sucessão do testador fideicomitente”.

Ora, conforme bem ponderado pelos embargados em sua impugnação, “o primeiro acórdão decidiu sobre legalidade de cláusula de testamento que determinou a substituição do fideicomissário falecido por seus descendentes, portanto, pessoas diversas da fiduciária, onde o testamento vedou expressamente a caducidade do fideicomisso e a consolidação na pessoa da fiduciária; enquanto que o segundo acórdão, de forma transversa, analisa testamento onde o testador determina que em caso de falecimento prévio de fideicomissário (filho do testador) os bens se consolidariam nos próprios fiduciários sobreviventes (netos do testador), o que configura hipótese diametralmente oposta ao acórdão anterior, visto que o testamento, neste caso, determinou a caducidade e consolidação dos bens do fideicomisso em favor dos fiduciários” (e-STJ, fl. 992).

Portanto, é evidente a falta de similitude fática e jurídica entre os julgados postos à confrontação.

Ante o exposto, com fundamento no Art. 266, § 3º, do Regimento Interno desta Corte, indefiro os embargos de divergência.

Intimem-se.

Brasília (DF), 14 de outubro de 2014.

MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Relator


Processo EREsp 1221817, Data da Publicação DJe 15/10/2014

Veja mais detalhes no Blog do 26º Tabelião de Notas da Capital

* Euclides de Oliveira e Sebastião Amorim, in Inventários e Partilhas, Direito das Sucessões – Teoria e Prática, Leud, 22ª edição, pgs. 280/283.

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