Súmula 377, casamento na Itália em 2001, incomunicabilidade dos bens

Súmula 377, casamento ocorrido na Itália em 2001, separação total de bens, incomunicabilidade.

Além do mais, o próprio Supremo Tribunal Federal amenizou tal entendimento, exigindo prova do esforço comum na aquisição do patrimônio havido na constância do casamento, e, de acordo com o teor da certidão do registro imobiliário, a recorrente adquiriu a nua propriedade e seus genitores o usufruto do imóvel por escritura pública de compra e venda datada de 11 de setembro de 2001, ou seja, quatro meses após a data do casamento, em clara indicação de não ter sido a aquisição fruto do esforço comum do casal.

Processo CGJ-SP n° 2013/168591
(113/2014-E)

Tabelião de Notas – Escritura de compra e venda de imóveis – Exigência da anuência do cônjuge da vendedora, cujo casamento foi celebrado na Itália sob o regime de separação de bens por opção dos contraentes e independentemente de pacto antenupcial, de acordo com a legislação vigente – Observância ao Artigo 7º, “caput”, e § 4°, da Lei de Introdução ao Código Civil e Artigo 32, “caput”, e § 1°, da Lei de Registros Públicos – Prevalência da regra da incomunicabilidade de bens – Exigência indevida – Recurso provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso administrativo interposto por MIRKA BAUCE contra a decisão do Juízo Corregedor Permanente do 1º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos da Comarca de Peruíbe, que em resposta à consulta de como proceder a qualificação notarial referente à lavratura de escritura de compra e venda sem outorga marital, no caso de matrimônio contraído em outro país (Província Italiana) sob o regime da separação absoluta de bens sem a celebração de pacto antenupcial, considerou imprescindível a presença do casal na condição de vendedores, em observância à Súmula n° 377 do STF e Artigo 8º do Decreto-lei n° 4657/42.

A recorrente sustenta que a Súmula n° 377 do STF se aplica aos casos nos quais o regime da separação de bens é obrigatório ou legal, como ocorria nos casamentos italianos anteriores ao ano de 1975, época na qual o regime de bens do casamento de acordo com a legislação em vigor era o da separação, porém, a partir do início de vigência da Lei n° 19, de 19/5/75, o regime legal passou a ser o da comunhão, razão pela qual a adoção do regime da separação por opção dos contraentes deve ser respeitada, e, quanto ao pacto antenupcial, diferentemente da legislação brasileira, este não é obrigatório na lei italiana em vigor.

A Procuradoria Geral da Justiça não se manifestou, por considerar inexistente interesse que justifique a intervenção do Ministério Público.
É o relatório.
Opino.

Da análise dos documentos trazidos aos autos, verifica-se que a recorrente contraiu matrimônio na Itália em 3 de maio de 2001 com António Carlos Morellato Júnior, conforme certidão de registro de casamento expedida pelo Consulado da República Federativa do Brasil em Milão, cuja transcrição foi providenciada em 29/06/2001 perante o Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas do 1º Subdistrito da Sede da Comarca de Jundiaí (fls. 29 e 34).

Aplica-se ao caso vertente o Artigo 7º, “caput”, da Lei de Introdução ao Código Civil, segundo o qual a lei do país onde está domiciliada a pessoa é que determina as regras gerais de direito de família, e o §4° do mesmo artigo, de que o regime de bens, legal ou convencional, obedece a lei do país que tiverem os nubentes domicílios, e, se este for diverso, a do primeiro domicílio conjugal. Ambos os contraentes eram domiciliados na Itália ao tempo do casamento.

O Artigo 32 da Lei n° 6.015/73 estabelece que os assentos de casamento de brasileiros em país estrangeiro serão considerados autênticos, nos termos da lei do lugar em que foram feitos, e, nos termos do §1°, deverão ser trasladados para produzir efeitos, portanto, o casamento da recorrente está produzindo efeitos no Brasil desde a data da transcrição providenciada, e se aplica o regime de bens estabelecido de acordo com as regras daquele país, sem que haja comunicação de bens havidos na constância do matrimônio.

Com efeito, o regime de bens legal adotado pela legislação italiana anteriormente ao advento da Lei n° 151 que passou a vigorar em 20/09/75 era o da separação de bens, e, a partir da vigência desta lei, passou a ser o da comunhão de bens. Assim sendo, ao tempo do casamento da recorrente o regime legal era o da comunhão, e a escolha pelos contraentes de regime diverso do legal, ou seja, o da separação de bens, passou a vigorar no ato da celebração, tal como consta do registro, independentemente de pacto, em conformidade com a legislação italiana (fls.15 e 17/18, e 16).

Nestas condições, está claro que o regime de separação de bens resultou de regular e legal opção dos contraentes, e se trata de negócio jurídico cuja lei brasileira reconhece o valor. Não há, pois, razão para que se exija pacto antenupcial e não é caso de aplicar a Súmula n° 377 do Supremo Tribunal Federal, pela qual no regime da separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento. Esta regra é restrita aos casos em que a lei brasileira impõe o regime de bens da separação, nos termos do Artigo 1.641 do Código Civil e Artigo 258, parágrafo único, do Código Civil revogado e, mesmo que não fosse, a recorrente e seu cônjuge não se enquadram em nenhuma das imposições legais deste regime obrigatório.

Além do mais, o próprio Supremo Tribunal Federal amenizou tal entendimento, exigindo prova do esforço comum na aquisição do patrimônio havido na constância do casamento, e, de acordo com o teor da certidão do registro imobiliário, a recorrente adquiriu a nua propriedade e seus genitores o usufruto do imóvel por escritura pública de compra e venda datada de 11 de setembro de 2001, ou seja, quatro meses após a data do casamento, em clara indicação de não ter sido a aquisição fruto do esforço comum do casal.

Em suma, não há comunicabilidade de bens por força do regime que rege o casamento da recorrente, o qual foi celebrado na Itália, cuja certidão de registro foi expedida pelo Consulado da República Federativa do Brasil em Milão e a transcrição foi regularmente providenciada, razão pela qual não é caso de exigir a anuência do cônjuge para a lavratura da escritura de compra e venda do imóvel.

À vista do exposto, o parecer que respeitosamente submeto ao elevado exame de Vossa Excelência, é de que seja dado provimento ao recurso, a fim de que a escritura pública de compra e venda do imóvel matriculado sob n° 200.808 do Registro de Imóveis de Itanhaém, seja lavrada mediante dispensa da anuência do cônjuge da titular do domínio da nua propriedade.
Sub Censura.
São Paulo, 07 de abril de 2014
ANA LUIZA VILLA NOVA
Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer da MMª Juíza Assessora da Corregedoria, e, por seus fundamentos, que adoto, dou provimento ao recurso.
São Paulo, 15/04/2014.
(a) – HAMILTON ELIIOT AKEL – Corregedoria Geral da Justiça.


Vide mais sobre a Súmula 377.

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