A volta do selo
A VOLTA DO SELO
por José Carlos Teixeira Giorgis
Como se vê, os tempos mudam, mas a ânsia fazendária se mantém insone e alerta na pesquisa de sofisticadas formas de engordar os cofres, sempre ávidos de entesouramento e do sacrifício do usuário.
Os advogados que foram noviços há lustros ainda recordam as agruras dos passos perdidos nos átrios forenses para cumprir as ordens fiscais. Era o reino da goma arábica(1). A ação entregue ao distribuidor judicial transformava o valor da causa em selos de diversas cores e tamanhos, que iam se enfileiravam no fim do petitório em geométrica ordem, sob os socos do punho funcional.
Os tributos e custas de algum inventário compunham sequência de chancelas e timbres. Ao se lavrar qualquer escritura ou instrumento, lá vinham os carimbos sobre o amontoado de estampilhas, até remanescendo alguns demoras quando não havia estoque suficiente, época de inauguração da máquina de escrever.
Após, surgiram notas avulsas, depois autógrafos mecânicos das caixas bancárias, os recibos soltos, enfim, expedientes que simplificam os protocolos e pragmática a relação jurídica, ainda mais rápido o cumprimento das tarefas profissionais.
Como apropriado, nos últimos vagidos do período parlamentar no RS, foi aprovada uma lei que dispõe sobre emolumentos dos serviços notariais e de registro, criando um selo digital e um fundo de gestão dos recursos obtidos (Lei nº 12.692, de 29/12/2006).
Sabido que emolumentos são as retribuições às atividades praticadas por algumas serventias e que devem corresponder ao custo e adequada remuneração dos serviços ali prestados (escrituras, testamentos, procurações, registros, notas). Agora, no âmbito do Tribunal de Justiça do RS será instituído um Selo Digital de Fiscalização Notarial e Registral, a ser implementado por meios eletrônicos de processamento de dados, de uso obrigatório em todos os atos daqueles cartórios, que solicitarão os lotes de estampilhas digitais ao poder indicado.
E para cada diligência notarial ou registral, a serventia deve fazer conexão com o sistema de informática judicial para solicitar um código de validação, que será impresso na nota entregue ao interessado, vedada a cobrança de outra quantia ou de outro selo por ato retificado ou refeito; e isentas as pessoas jurídicas de direito público.
Os valores do selo variam entre 20 centavos, para emolumentos até aproximadamente nove reais, até dez reais para atos acima de trezentos mil reais; e têm por objetivo transferir ao Judiciário os recursos destinados a ressarcir as despesas de fiscalização dos atos cartorários, compensá-los pela prática de atos gratuitos de imposição legal e assegurar renda mínima aos serviços deficitários.
As importâncias auferidas, que também serão compostas por recolhimentos digitais dos centros de registro de veículos automotores, serão administradas por um fundo, dirigido por conselho gestor, que tem como titulares o presidente do TJRS, o corregedor-geral da Justiça, um desembargador escolhido pela administração do Judiciário, o juiz diretor do Foro, um representante do Colégio Notarial e outro do Colégio Registral.
O colegiado ditará normas sobre a aplicação dos recursos, sobre a contratação de executivos, a distribuição da receita e a forma de transferência mensal ao fundo etc.
Como se vê, os tempos mudam, mas a ânsia fazendária se mantém insone e alerta na pesquisa de sofisticadas formas de engordar os cofres, sempre ávidos de entesouramento e do sacrifício do usuário.
Notas do editor: (1) O uso da goma-arábica vem pelo menos desde o Antigo Egito, onde era utilizada na confecção de cosméticos e de perfumes e como ingrediente no processo de mumificação.
Dr. José Carlos Teixeira Giorgis é Desembargador aposentado do TJRS.