CSM-SP – Carta de Adjudicação, indisponibilidade de bens, registro viável

Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº xxx, da Comarca de Limeira, em que são partes é apelante L. C. S., é apelado 2º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE LIMEIRA.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso, para viabilizar o registro do título . v. u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), RICARDO DIP (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E SALLES ABREU (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

Registro de imóveis – Dúvida – Carta de Adjudicação – Ordem de indisponibilidade emanada de Juízo diverso daquele em que arrematado o imóvel – Provimento 39/14 do CNJ que, em seu Artigo 16, permite o registro, ainda que faça alusão à menção, na carta de arrematação, de “prevalência da alienação judicial em relação à restrição oriunda de outro juízo” – Prescindibilidade de previsão expressa – Prevalência ínsita à própria expedição da carta de arrematação – Entendimento pacífico e reiterado deste Conselho Superior da Magistratura – Precedentes das Câmaras de Direito Privado e de Direito Público deste E. TJSP, bem como do C. STJ – Dúvida improcedente – Recurso provido.

Cuida-se de recurso de apelação tirado de r. sentença do MM. Juiz Corregedor Permanente do 2º Oficial de Registro de Imóveis e Anexos de Limeira, que julgou procedente dúvida suscitada para o fim de obstar registro de carta de arrematação, referente a imóvel sobre o qual recaem ordens judiciais de indisponibilidade, emanadas de Juízos distintos daquele em que havida a arrematação.

O apelante afirma, em síntese, nulidade da r. sentença, por falta de fundamentação. Pondera que o título cujo registro se almeja foi expedido anos antes da decretação de indisponibilidade. Sustenta que o Artigo 16 do Provimento 39/14 do CNJ merece interpretação diversa daquela que lhe deu o MM. Juízo singular, a viabilizar o registro obstado.

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

Preambularmente, cumpre observar que a r. sentença recorrida contém suficiente fundamentação a amparar a solução alvitrada pelo MM. Juízo a quo. Bem delineados os motivos que conduziram ao decreto de procedência da dúvida, com citação de fontes legislativas e antecedentes jurisprudenciais. Em nulidade, pois, não se há falar.

À luz do Artigo 16 do Provimento 39/14 do E. CNJ:

“As indisponibilidades averbadas nos termos deste Provimento e as decorrentes do § 1º, do Art. 53, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, não impedem a inscrição de constrições judiciais, assim como não impedem o registro da alienação judicial do imóvel desde que a alienação seja oriunda do juízo que determinou a indisponibilidade, ou a que distribuído o inquérito civil público e a posterior ação desse decorrente, ou que consignado no título judicial a prevalência da alienação judicial em relação à restrição oriunda de outro juízo ou autoridade administrativa a que foi dada ciência da execução.

Parágrafo único. Consistindo eventual exigência para o registro de alienação judicial de imóvel atingido por ordem de indisponibilidade na falta de indicação, no título, da prevalência da alienação judicial em relação à restrição oriunda de outro juízo ou autoridade administrativa a que foi dada ciência da execução, será o fato comunicado ao Juízo que expediu o título de alienação, visando sua complementação, ficando prorrogada a prenotação por 30 dias contados da efetivação dessa comunicação.”

Consoante se verifica da parte inicial do caput do Art. 16, ordens judiciais de indisponibilidade não impedem que se providencie válida alienação judicial do imóvel, com respectivo registro. Esta, a regra. O dispositivo em voga prevê a condicionante de que a alienação tenha emanado do mesmo juízo que decretou a indisponibilidade, ou de que esteja “consignado no título judicial a prevalência da alienação judicial em relação à restrição oriunda de outro juízo ou autoridade administrativa a que foi dada ciência da execução”.

Na específica hipótese dos autos, apesar de o decreto de indisponibilidade advir de Juízo distinto daquele que providenciou a alienação forçada, é de se amainar a necessidade de que a carta de arrematação contenha expressa menção de prevalência da venda judicial. Deveras, a preferência da alienação judicial sobre eventuais decretos de indisponibilidade é ínsita à expedição da carta de arrematação ou de adjudicação. A finalidade precípua da carta é viabilizar o registro da venda forçada. Seria de todo incongruente que o Juízo em que efetuada a hasta pública expedisse carta de arrematação ou de adjudicação, se não fosse para que arrematante ou adjudicante pudesse levá-la a efetivo registro. Quando da ordem de expedição da carta de arrematação, o Juízo que providenciou a alienação já está afirmando, porque consequência imanente ao ato, que o respectivo registro há de ser efetuado, ainda que Juízo distinto tenha decretado a indisponibilidade do bem arrematado.

Note-se que o registro não trará, em tese, prejuízo àquele cuja demanda tenha ensejado o decreto de indisponibilidade. O crédito que possui subroga-se no preço da arrematação, sem alteração alguma na ordem de preferência.

Tampouco se olvide que o destinatário da determinação judicial de indisponibilidade é o próprio devedor. A ordem presta-se a obstar que o devedor, sponte propria, por alienação entre particulares, desfaça-se de seu patrimônio, furtando-se ao pagamento da dívida. Todavia, a ordem de indisponibilidade não impede a venda judicial do bem.

Há, aliás, expressa previsão em similar sentido, no item 405, do Capítulo XX, Tomo II, das NSCGJ:

“As indisponibilidades averbadas nos termos do Provimento CG. 13/2012, e na forma do § 1º, do Art. 53, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, não impedem a alienação, oneração e constrição judiciais do imóvel.”

É, ademais, entendimento sedimentado por Este Egrégio Conselho Superior da Magistratura que eventual decreto judicial de indisponibilidade apenas diz respeito à venda voluntária do bem pelo devedor. Não impede que se o penhore, que se o leve à hasta, nem que se registre a alienação forçada.

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Título judicial – Carta de arrematação – Propriedade do imóvel em nome de terceiro estranho à execução – Falta de registro dos direitos dos executados no fólio real – Direito real de aquisição sobre o imóvel pertencente a terceiro – Vaga de garagem não especificada – Ofensa aos princípios registrais da continuidade, disponibilidade e da especialidade objetiva – Averbação de indisponibilidade que não constitui óbice à alienação judicial – Dúvida procedente – Recurso desprovido.

Em arremate, a mencionada averbação nº 1 também faz expressa alusão à indisponibilidade dos bens em nome do promitente comprador S. S., averbada sob o nº 6 na matrícula nº xxx do 3º RI desta Capital. Quanto a isso, entretanto, o obstáculo levantado pelo suscitante não merece prevalecer. Consoante orientação retirada do item 405 do Cap. XX das NSCGJ, tal indisponibilidade não impede a alienação, oneração e a constrição judicial do imóvel por ela atingido.” (APELAÇÃO CÍVEL: 1077741-71.2015.8.26.0100, Rel. Des. Manoel de Queiroz Pereira Calças, DJ 16/6/16)

“Registro de Imóveis – dúvida – carta de arrematação – imóveis indisponíveis – penhora em execução fiscal a favor da fazenda nacional – recusa de registro com base no artigo 53, §1°, lei 8.212/91– alienação forçada – registro viável – recurso provido.” (APELAÇÃO CÍVEL: 3000029-33.2013.8.26.0296, Rel. Des. Elliot AKEL, DJ 5/5/14)

REGISTRO DE IMÓVEIS – dúvida inversa – imóvel penhorado com base no Art. 53, §1°, da Lei 8.212/91 Indisponibilidade que obsta apenas a alienação voluntária Possibilidade de registro da Carta de Arrematação – Recurso provido” (Apelação Cível n 0004717-40.2010.8.26.0411 – Relator Desembargador Renato Nalini, DJ 27/8/12).

Para o mesmo Norte, aponta a remansosa jurisprudência das Câmaras de Direito Privado e de Direito Público desta Alta Corte Bandeirante:

“A decretação de indisponibilidade atinge apenas os atos voluntários do titular do bem, não o tornando impenhorável para outras execuções. Assim, o decreto de indisponibilidade do imóvel pela averbação na matrícula em desfavor do executado não é fato impeditivo para a realização da constrição.

De fato, a decretação de indisponibilidade de bens tem apenas a finalidade de impedir que o réu de determinada ação aliene ou grave por vontade própria seu patrimônio, esvaziando-o em prejuízo de eventuais credores, o que não impede que sobre ele também recaia penhora.” (Agravo de Instrumento nº 2006767-64.2016.8.26.0000, 8ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Ponte Neto, j. 25/5/16)

“Agravo de instrumento Ação de execução de título extrajudicial Alegação de nulidade por ausência de fundamentação que não prospera Decisão que esclareceu o motivo pelo qual indeferiu a penhora – Penhora – Indeferimento tendo em vista a indisponibilidade do bem, decorrente de execução promovida pela Fazenda Pública – Alegada possibilidade da constrição – Acolhimento – Indisponibilidade que impede tão somente atos de disposição do devedor, não obstando penhora do bem, nem alienação judicial – Necessidade de observância, apenas, da preferência do crédito fiscal Recurso provido. (Agravo de Instrumento 2200292-45.2015.8.26.0000, Relator(a): Jacob Valente 12ª Câmara de Direito Privado, j. 30/11/2015)

EXECUÇÃO. Decreto de indisponibilidade de bens proferido em ação civil pública não impede a penhora determinada em outras exceções movidas contra o mesmo devedor. Precedentes. RECURSO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento 2187730-04.2015.8.26.0000, Relator(a): Paulo Alcides, 6ª Câmara de Direito Privado, j. 02/10/2015).

Não bastasse, é a firme posição do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

“PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NA MEDIDA CAUTELAR. IMÓVEL PENHORADO EM EXECUÇÃO FISCAL. INDISPONIBILIDADE. ART. 53, § 1º, DA LEI 8.212/91. NOVA PENHORA EM OUTRO PROCESSO. POSSIBILIDADE. ARREMATAÇÃO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO CREDOR HIPOTECÁRIO. EFICÁCIA DO ATO FRENTE AO EXECUTADO E AO ARREMATANTE. ALIENAÇÃO JUDICIAL DE BEM PENHORADO. LAPSO TEMPORAL RAZOÁVEL ENTRE A AVALIAÇÃO DO BEM E A HASTA PÚBLICA. REAVALIAÇÃO. DEMONSTRAÇÃO DA NECESSIDADE. SIMPLES ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA.

A indisponibilidade de que trata o Art. 53, § 1º, da Lei 8.212/91, refere-se à inviabilidade da alienação, pelo executado, do bem penhorado em execução movida pela Fazenda Pública, o que não impede que recaia nova penhora sobre o mesmo bem, em outra execução. Precedentes. (…) Agravo a que se nega provimento“ (AgRg na MC nº 16.022/SP, 3ª Turma, Relatora Ministra Nancy Andrighi, 27/04/2010).

“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. PENHORA. INDISPONIBILIDADE. IMÓVEL PENHORADO EM EXECUTIVO FISCAL. ART. 53, § 1º, LEI 8.212/91. ALIENAÇÃO FORÇADA. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO ART. 711 DO CPC.

I – A indisponibilidade a que se refere o Art. 53, § 1º, da Lei nº 8.212/91, traduz-se na invalidade, em relação ao ente Fazendário, de qualquer ato de alienação do bem penhorado, praticado sponte propria pelo devedor-executado após a efetivação da constrição judicial.

II – É possível a alienação forçada do bem em decorrência da segunda penhora, realizada nos autos de execução proposta por particular, desde que resguardados, dentro do montante auferido, os valores atinentes ao crédito fazendário relativo ao primeiro gravame imposto.” (RECURSO ESPECIAL Nº 512.398 – SP (2003/0031765-1) RELATOR: MINISTRO FELIX FISCHER, j. 17/02/2004)

Por todo o aduzido, dou provimento ao recurso, para viabilizar o registro do título.

São Paulo, 05 de dezembro de 2017.

MANOEL DE QUEIROZ PEREIRA CALÇAS

Corregedor Geral da Justiça e Relator


Este texto não substitui o publicado no DJe-SP em 07/05/2018.

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