CSM-SP – Inventário – necessário arrolar todos os imóveis

Negado registro de escritura de inventário e partilha que arrolou apenas um dos bens imóveis deixados pela autora da herança –Alegada dificuldade financeira dos sucessores em arcar com as despesas relativas ao inventário da totalidade dos bens do ‘de cujus’, que não se confunde com a hipótese de ‘bens de liquidação difícil’, prevista pelo artigo 2.021 do Código Civil.

ACÓRDÃO – Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 994.09.231.643-6 (antigo DJ-1.235-6/1), da Comarca da CAPITAL, em que são apelantes MANOEL DOMINGUES e OUTROS e apelado o 17º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS da referida Comarca.

ACORDAM os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, em negar provimento ao recurso, de conformidade com o voto do Desembargador Relator, que fica fazendo parte integrante do presente julgado.

Declararam voto o Desembargador Revisor e o Desembargador Ciro Campos.

Participaram do julgamento os Desembargadores VIANA SANTOS, Presidente do Tribunal de Justiça, MARCO CÉSAR, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, REIS KUNTZ, Decano, CIRO CAMPOS, LUIS GANZERLA e MAIA DA CUNHA, respectivamente, Presidentes da Seção Criminal, de Direito Público e de Direito Privado do Tribunal de Justiça.

São Paulo, 14 de setembro de 2010.

(a) MUNHOZ SOARES, Corregedor Geral da Justiça e Relator

V O T O – REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida julgada procedente – Negado registro de escritura de inventário e partilha que arrolou apenas um dos bens imóveis deixados pela autora da herança – Inobservância do que dispõe o item 119, do Capítulo XIV, das Normas de Serviços da Corregedoria Geral da Justiça – Alegada dificuldade financeira dos sucessores em arcar com as despesas relativas ao inventário da totalidade dos bens do ‘de cujus’, que não se confunde com a hipótese de ‘bens de liquidação difícil’, prevista pelo artigo 2.021 do Código Civil – Recurso não provido.

Trata-se de apelação interposta por Manoel Domingues, Leonel Justino Domingues e Moacir D’Assumpção Domingues contra sentença que julgou procedente dúvida suscitada pelo Décimo Sétimo Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital, que negou o registro de escritura pública de inventário e partilha dos bens deixados por Ermezinda D’Assumpção Domingues, em razão de ter por objeto apenas o imóvel matriculado sob número 30.804, não obstante a existência de outros bens deixados pela autora da herança.

Os apelantes sustentaram ser viável o registro da escritura de inventário e partilha amigável tendo por objeto apenas parte dos bens deixados pelo autor da herança, visto que o artigo 2.021 do Código Civil autoriza a realização de sobrepartilha dos bens, ante o consentimento da maioria dos herdeiros. Afirmaram que não possuem condições financeiras de arcar com as despesas referentes a todos os bens deixados pelo ‘de cujus’, o que caracteriza a hipótese legal de ‘bens de difícil liquidação’ que permite a partilha posterior. Aduziram que o item 119, do Capítulo XIV, das Normas de Serviços da Corregedoria Geral da Justiça, admite a partilha parcial, desde que justificada a não inclusão do bem arrolado. Sustentaram que a decisão de primeiro grau não respondeu às seguintes indagações: 1) Não ocorrendo a sonegação de bens, admite-se que o inventário seja processado como sobrepartilha? 2) As exceções previstas pelo artigo 2.021 do Código Civil, em especial a que se refere aos bens de liquidação morosa ou difícil, abrangem a situação de dificuldade financeira para fazer frente às despesas decorrentes do inventário? 3) A escritura de inventário e partilha em exame é válida? E, em caso afirmativo, deverá o Oficial de Registro de Imóveis proceder ao seu registro, bem como de demais sobrepartilhas?

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo provimento do recurso.

É o relatório.

Primeiramente, não se pode perder de vista que cabe ao Oficial Registrador proceder à qualificação do título, até mesmo quando se trate de título emanado de autoridade judicial.

Neste sentido, veja-se o que restou decidido na Apelação Cível n° 22.417-0/4, da Comarca de Piracaia, relatada pelo eminente Desembargador Antonio Carlos Alves Braga, então Corregedor Geral da Justiça, cuja ementa é a seguinte:

Registro de Imóveis – Dúvida – Divisão – Submissão da Carta de Sentença aos princípios registrários – Qualificação dos títulos judiciais – Prática dos atos registrários de acordo com as regras vigentes ao tempo do registro – Recurso negado.

A necessidade de prévia qualificação de qualquer título pelo Oficial Registrador se encontra, aliás, expressamente prevista pelas Normas de Serviço da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, conforme se verifica do item 106 do Capítulo XX, Tomo II, a saber:

‘Incumbe ao oficial impedir o registro de título que não satisfaça os requisitos exigidos pela lei, quer sejam consubstanciados em instrumento público ou particular, quer em atos judiciais.’

Portanto, o fato de o Oficial ter recusado o pedido de registro da escritura de inventário e partilha em exame constitui-se em mera expressão do exercício de sua função delegada, encontrando-se inserida entre suas atribuições, como se sabe, aquela de proceder à qualificação dos títulos que lhe são apresentados na Serventia.

Quanto à questão de fundo, sem embargo do parecer favorável da I. Procuradoria Geral de Justiça, a presente apelação não merece provimento.

O título em tela teve seu registro recusado por se tratar de escritura pública de inventário e partilha em que foi inventariado apenas um único imóvel entre aqueles deixados pela autora da herança, mesmo tendo pleno conhecimento os ora apelantes acerca da existência de outros bens inventariáveis.

A recusa de registro deve ser mantida, visto que, conforme estabelece o item 119 do Capítulo XIV, das Normas de Serviços da Corregedoria Geral da Justiça, invocado pelos próprios apelantes, só se admite o inventário com partilha parcial se não houver sonegação de bens no rol inventariado e desde que se justifique a não inclusão do bem arrolado na partilha. (grifei)

A exceção prevista por referido item das Normas de Serviços da Corregedoria Geral da Justiça se limita, pois, a permitir que a partilha seja parcial, isto é, que nem todos os bens deixados pelo autor da herança sejam imediatamente partilhados entre seus sucessores, desde que justificada tal ocorrência, mas não autoriza que bens, a que pretexto for, sejam deliberadamente omitidos do respectivo rol, ressalvando, ao contrário, de maneira expressa, ser vedada a sonegação de bens no rol inventariado.

Destarte, resta claro que as Normas de Serviços da Corregedoria Geral da Justiça não se constituem em permissivo para que o inventário dos bens deixados pelo ‘de cujus’ seja realizado em parcelas, de acordo com a mera conveniência dos sucessores, como pretendido pelos ora apelantes, autorizando, como visto, apenas que a partilha de determinados bens seja relegada para momento posterior, justificando-se tal circunstância.

A alegada dificuldade financeira dos sucessores quanto a fazer frente às despesas inerentes ao inventário dos bens deixados pela autora da herança, diversamente do que sustentado, não caracteriza a hipótese de bem de difícil liquidação, que, segundo o artigo 2.021 do Código Civil, autorizaria a sobrepartilha.

Com efeito, de acordo com o artigo 2.021 do Código Civil:

‘Quando parte da herança consistir em bens remotos do lugar do inventário, litigiosos, ou de liquidação morosa ou difícil, poderá proceder-se, no prazo legal, à partilha dos outros, reservando-se aqueles para uma ou mais sobrepartilhas, sob a guarda e a administração do mesmo ou diverso inventariante, e consentimento da maioria dos herdeiros’.

Ao referir-se a bens de liquidação morosa ou difícil, referido dispositivo legal deixa claro que a sobrepartilha por ele autorizada pressupõe uma característica objetiva dos bens a serem partilhados e não uma condição pessoal dos herdeiros, que, supostamente, não teriam condições financeiras para fazer frente às despesas do inventário da totalidade do patrimônio deixado pelo ‘de cujus’.

Como bem sublinhou o MM. Juiz Corregedor Permanente em sua decisão (fls.72); dificuldade financeira não se confunde com dificuldade de liquidar o bem.

Tendo em vista, pois, que o título objeto deste procedimento não observou as exigências legais para a realização do inventário em exame, mostra-se correta, por conseguinte, a manutenção da recusa de seu registro, como decidido em primeiro grau.

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

(a) MUNHOZ SOARES, Corregedor Geral da Justiça e Relator


V O T O

Acompanho o nobre Relator.

Por proêmio, cumpre consignar que, dentre as atribuições que competem ao Oficial Registrador, está a de realização de qualificação do título, ainda que oriundo de autoridade judicial, conforme assente nas Normas de Serviço da Egrégia Corregedoria Geral de Justiça, item 106 do Capitulo XX, Tomo II, bem assim, precedentes deste Colendo Conselho.

Quanto ao mérito, nada há que se alternar no decisum hostilizado porquanto, levado a registro a escritura de inventário e partilha, necessário fazer constar todos os bens pertencentes ao de cujus, regra que embora comporte exceção, não é aplicável na espécie dos autos.

Com efeito, o inventário parcial de bens é medida excepcional, com previsão no item 119 do Capítulo XIV, das Normas de Serviços da Corregedoria Geral da Justiça, que autoriza tal providência, condicionada, todavia, à justificação, afastando então a conveniência dos sucessores.

Já o artigo 2.021 do Código Civil que autoriza seja feito o inventário parcial de bens, deveria ser feito ante a existência de bens de difícil liquidação, tratados pelo legislador como “bens remotos do lugar do inventário, litigiosos, ou de liquidação morosa ou difícil”, sendo certo que, no caso dos autos, a alegada insuficiência patrimonial dos sucessores não é alcançada por esta disposição legal.

Nego, pois, provimento ao recurso.

(a) REIS KUNTZ , Revisor Convocado


VOTO CONVERGENTE

Acompanho o voto do eminente relator, porque:

I – É atribuição do Oficial Registrador a qualificação do título apresentado a registro, ainda que judicial, na forma do item 106 do Cap. XX, do Tomo II, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça.

II – Embora admissível inventário com partilha parcial, é indispensável que todos os bens deixados pelo autor da herança sejam arrolados, estando vedada a sonegação, nos termos do disposto no item 119 do Cap. XIV das Normas de Serviço referidas. Na espécie a escritura pública de inventário e partilha contém sonegação de bens.

III – As dificuldades financeiras dos sucessores não constituem causa legal para a pretensão de partilha parcial, notadamente sob o fundamento de “bem de difícil liquidação”, consoante prescreve o art. 2.021 do CC. A dificuldade de liquidação legalmente prevista é objetiva e está relacionada ao bem e não à pessoa dos herdeiros.

Por tais razões, também nego provimento ao apelo.

(a) Desembargador CIRO CAMPOS


(D.J.E. de 26/11/2010)

 

 

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