Inventário e recebimento de PIS/Pasep

… Informamos que não será necessário retificar o inventário, pois o mesmo não precisa fazer menção ao Pasep; orientamos o senhor que compareça na agência de sua preferência para que possa ser realizado o pagamento do Pasep.

Os herdeiros e sucessores da pessoa falecida não precisam retificar um inventário feito, judicial ou extrajudicialmente, unicamente para dele fazer constar que existia um crédito em nome do falecido. Quem garante é o bom senso. a Ouvidoria do Banco do Brasil confirma e o tabelião divulga. (*)

Em data recente o portal de serviços e notícias Universo Online – UOL  (**) informou que cinco milhões de cotistas do fundo PIS/Pasep ainda não compareceram à Caixa ou ao Banco do Brasil para solicitar o resgate do valor depositado sob a sua titularidade.

As siglas mencionadas – PIS/Pasep – identificam um  programa público de natureza social que existiu entre os  anos de 1971 e 1988. Os créditos ainda hoje existentes em contas que não puderam ser objeto de saque por seu titular resultam de depósitos feitos por empresas e órgãos públicos em benefício de seus funcionários e servidores regularmente contratados. O texto inicialmente citado bem esclarece que “a partir de outubro de 1988, os trabalhadores deixaram de ter contas individuais do Fundo PIS/Pasep. Desde então, o dinheiro arrecadado vai para o FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), que é usado para pagar benefícios como seguro desemprego e abono salarial”.

Evidente, portanto que nenhuma pessoa com idade menor de 40 anos possui quotas ou interesse neste tipo de programa social, que era destinado unicamente a trabalhadores regulares e que foi extinto a 30 anos.

Tratando-se de um assunto que interessa, segundo a informação veiculada,  a um universo de cinco milhões de pessoas (que já deixaram de ser jovens) é natural imaginar-se que uma grande quantidade destas pessoas não irá mesmo comparecer ao banco e solicitar o seu crédito, simplesmente porque a longevidade tem limites e a morte alcança a todos. Se em vida, o credor não conseguiu receber os seus créditos, após o falecimento, seus herdeiros é que o farão. E isso pode representar alguma dificuldade prática. A primeira e muito útil informação a ser considerada é a de que o saque pelos herdeiros poderá ser feito a qualquer momento e não há prazo fixado para fazer a solicitação do crédito eventualmente existente.

Desnecessária, portanto, correria ou preocupação excessiva com os dias do calendário.

A data de 28 de setembro, somente importa para quem pessoalmente deveria solicitar o resgate e, se não o fizer, sofrerá alguma consequência. Tal hipótese certamente não se aplica para pessoas falecidas.

O INFERNO ESTÁ NOS DETALHES

O autor destas linhas, tabelião de notas na cidade de Campinas, vivenciou recentemente duas situações em que os herdeiros procuraram os seus serviços e solicitaram a realização de Escrituras de Sobrepartilha de Inventários regularmente realizados e concluídos, unicamente para ali fazer constar que o falecido deixou um saldo de crédito em uma conta vinculada do Pasep.

Nestes dois casos o Banco do Brasil (por meio de diversas agência da cidade, segundo se informou) estava a exigir um Alvará Judicial ou Retificação da Escritura, para realizar o pagamento aos herdeiros de valores existentes na conta de titularidade da pessoa falecida.

Para realizar e solicitada Sobrepartilha, a primeira dúvida que surgiu foi com relação a eventual incidência de Imposto de Transmissão (a ser acrescida de multa e juros como penalidade pela ocultação de algum bem do falecido). Imediatamente, entretanto, a advogada ressalvou tratar-se de verba ou crédito de natureza trabalhista/previdenciária; isenta da incidência de qualquer Imposto de Transmissão Causa-mortis e por, consequentemente, de multa ou juros moratórios.

O saldo existente então, apesar de isento de imposto de transmissão, certamente representa um valor econômico a ser considerado. Segundo as orientações normativas; qualquer forma de sobrepartilha realizada em tabelionato resulta em Escritura Pública com cobrança de emolumentos e custas apuradas com base no valor econômico do instrumento. Proporcionalmente ao crédito existente em nome do falecido as despesas para uma sobrepartilha não seriam desprezíveis (Vale dizer: iria ficar relativamente caro fazer este instrumento).

Diante da alega intransigência do Banco em realizar os pagamentos devidos sem a retificação dos documentos existentes, os interessados concordaram em realizar as escrituras. Definida a questão da ausência de Tributo, do pagamento dos emolumento e custas devidos, seria então o caso de providenciar a realização do instrumento. Entretanto, como profissional de direito que é, o tabelião de notas não existe apenas para atender o pedido e vontade de seus usuários e sujeitar-se a quaisquer exigências burocráticas descabidas e sem sentido algum.

Teimosamente este tabelião insistia na desnecessidade da realização de qualquer retificação dos documentos existentes e, mesmo sem a autorização dos usuários, fez uma consulta formal para a Ouvidoria do Banco do Brasil solicitando esclarecimentos sobre a necessidade do procedimento de sobrepartilha e retificação.

A primeira resposta dada foi rápida, mas inconclusiva. Limitava-se a reproduzir instrução de conhecimento de todas as partes e que não solucionava a dúvida.

O texto, com destaques no original, era:

“Prezado Marco Antônio, boa tarde!
Com relação à ocorrência aberta no BB Atende de nº 56795725, informamos que obtivemos resposta da Diretoria responsável autorizando o pagamento do Pasep aos herdeiros legais, sendo necessário a apresentação dos documentos descritos abaixo, os quais já foram encaminhados ao senhor pela Central de Atendimento:
 
certidão de óbito E certidão ou declaração de dependentes (beneficiários) habilitados à Pensão por Morte emitida pelo INSS, na qual conste o nome completo do dependente, data de nascimento e grau de parentesco ou relação de dependência com o participante falecido, conforme modelo de Certidão de dependentes à pensão por morte; OU
 
certidão de óbito E certidão ou declaração de dependentes (beneficiários) habilitados à Pensão por Morte, emitida pelo ente federativo ou órgão do RPPS correspondente, para os casos de servidores públicos, na qual conste o nome completo do dependente, data de nascimento e grau de parentesco ou relação de dependência com o participante falecido; OU
 
alvará judicial designando os beneficiários do saque e, caso o alvará judicial não faça menção ao falecimento do participante, solicite também a certidão de óbito; OU
 
escritura pública de inventário, podendo ser apresentado formal de partilha dos autos de processo judicial de inventário/ arrolamento ou escritura pública de partilha extrajudicial lavrada pelo tabelião do cartório de notas….”

O texto, portanto, não afastava a dúvida sobre a alegada necessidade de retificar a Escritura Pública de Partilha já concluída.

Um novo questionamento foi feito, quando nova resposta foi dada, mas igualmente ainda não satisfatória. A persistência, de fato, é uma virtude: nova questão foi enviada para análise da Instituição. Segue sua transcrição integral:

“Tomo a liberdade de repetir a bem-humorada expressão popular – o inferno está nos detalhes!
 
Então, por conta de um pequeno detalhe, ainda não tive respondida com a clareza necessária a pergunta que, por duas vezes já fiz!
 
O diabólico detalhe que inferniza a vida das pessoas (estou sendo irônico, perdão!) é que em algumas situações não se identificam as hipóteses abaixo indicadas sob nº 1, 2 ou 3 e o pedido de recebimento se faz com base na hipótese de nº 4.
 
Simplesmente se fez o inventário da pessoa falecida; existe uma escritura pública lavrada em tabelionato (ou um Formal de Partilha Judicial) e, portanto, estariam identificados adequadamente o falecido, seus herdeiros, obrigações e tudo o mais. Seria caso de pagar o saldo do PIS/Pasep para aquelas pessoas ali indicadas, entretanto (eis o detalhe infernal), dentre o rol dos bens deixados pelo morto não existe a indicação de que ele teria deixado um saldo de PIS/Pasep.
 
A agência pagadora do benefício, procura dentre os bens deixados pelo falecido a menção expressa a eventual saldo de PIS/Pasep; não encontra a informação (evidente, ninguém sabia desta existência…) e então EXIGE O ALVARÁ JUDICIAL ou RETIFICAÇÃO  de todo o inventário realizado alhures apenas por conta desta “omissão”.
 
A pergunta que faço pela terceira vez, e que até então não obteve uma resposta clara e inequívoca, para apresentar para os usuários do tabelionato é esta:  Está correta tal exigência ?  (retificar tudo o que foi feito antes!!!). Seria mesmo necessário RETIFICAR a Escritura Pública de Inventário apenas para constar que existia um saldo de PIS/Pasep?
 
Grato pela atenção”
 
Após esta última interpelação a resposta dada finalmente solucionou o impasse e vale ser transcrita, em todos os termos:

“Brasília, DF, 14/09/2018. / Prezado(a),
 
Em atenção à sua manifestação, informamos que não será necessário retificar o inventário, pois o mesmo não precisa fazer menção ao Pasep, orientamos o senhor que compareça na agência de sua preferência para que possa ser realizado o pagamento do PASEP. (grifei)
 
Ao comparecer na agência, leve os documentos de identificação pessoal (RG, CPF, Comprovante de endereço e demais documentos ref. ao inventário citado) e cite o número dessa ocorrência 56795725 de Ouvidoria ao ser atendido na agência.
 
Prestados estes esclarecimentos lamentamos quaisquer mal entendidos ocasionados ao tempo em que reafirmamos o compromisso do Banco do Brasil com o melhor atendimento  e permanecemos à disposição para quaisquer outros esclarecimentos que se fizerem necessários. …  Atenciosamente  /  Ouvidoria BB”
 
Finalmente uma luz! Um farol a iluminar a escuridão das almas e as mentes burocratas e insensíveis ao drama humano que representa a retificação de um instrumento público notarial ou judicial.

Mais infernal que os detalhes, são a insensibilidade e a indiferença.

Diante da clareza da orientação, evidentemente, foi dispensada a realização de qualquer sobrepartilha e os herdeiros já se habilitaram ao recebimento de seus direitos.

Claro que com este proceder o tabelionato deixou de receber emolumentos e este tabelião nada ganhou além de uma pequena lição sobre o valor da persistência, da importância de insistir na defesa das próprias convicções e na obediência dos princípios fundamentais de sua atividade profissional.

Concluindo a história: este autor está convencido de que tão importante quanto obter ganhos econômicos com a atuação profissional, a satisfação do dever cumprido é o que torna prazeroso seu ofício de tabelião.

É por estas e outras histórias que ainda é possível acreditar no futuro da instituição.

Os cartórios de notas, ao contrário do que possa parecer, certamente tem potencial para assumir o papel de importante aliado de seus usuários contra a impessoalidade e a aridez da burocracia.


(*) Marco Antonio de Oliveira Camargo é Tabelião de Notas e Oficial de Registro Civil do distrito de Sousas, município de Campinas – SP

(texto concluído em 18/09/2018)

Fonte: CNB/CF

 

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