Spix & Martius

Série de 1994 propõe um percurso pelo Brasil no século 19

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Spix, Martius e outros passageiros em travessia para o Brasill, 1817. Aquarela de Thomas Ender (Biblioteca Nacional)

Spix & Martius – A Terceira Viagem

Nos anos 1990, séries temáticas em 13 programas eram uma das marcas da Cultura FM, ocasião em que especialistas abordavam os mais diversos assuntos da história da música. No caso destes programas não se tratava exatamente de música e muito menos de um experto em algum assunto. Pelo contrário, eu estava aprendendo sobre o Brasil a partir do olhar de dois naturalistas alemães, Johann Baptist von Spix e Carl Friedrich Philipp von Martius, que percorreram em lombo de burro e canoa boa parte do território nacional entre 1817 e 1819.

Esta aventura radiofônica me permitiu e me obrigou a abraçar a pesquisa. Naquele momento, aprendi com Anna Maria Kieffer a cruzar os dados bibliográficos e a levantar hipóteses. Que no meio rádio podiam se concretizar em som. Tratava-se do projeto de conclusão de minha graduação em rádio e televisão, pela Universidade Estadual Paulista. Também meu primeiro trabalho junto à Cultura FM, ainda como estagiário, que contou com o aporte da Fundação Martius – Staden Institut.  Com ele passei a pensar o rádio à luz da Teoria da Comunicação e da Semiótica, graças à minha orientadora Carmen Lúcia José.

A partir da ideia de transcriação – num exercício de quase-cinema – apresentamos nossa “Terceira Viagem”, a viagem sonora. O subtítulo da série se justifica: a “segunda viagem” teria sido os diários dos viajantes. E a primeira, evidentemente, os cerca de 10 mil quilômetros percorridos originalmente pelos naturalistas. Assim, foram muitas liberdades poéticas, acertos e, sobretudo, erros de principiante. Mas é certo que naquela ocasião, a série obteve grande repercussão entre nossos ouvintes e entre a comunidade botânica. Por isso sua disponibilização agora em acervo digital.

Poderia escrever páginas sobre a realização desse trabalho. Mas para não me alongar, descrevo aqui a mais curiosa passagem musical deste projeto. Na Bahia, Martius (que era violinista), tocou com um sertanejo de nome João Raposo o “mais antigo quarteto de Playel”. Mas compositor francês em voga naquele início de século 19 havia caído no esquecimento, a ponto de não conseguirmos encontrar nenhuma gravação nem mesmo suas partituras. Louis Robin, produtor da Cultura FM, então vivendo em Paris, conseguiu localizar um exemplar da edição original na Biblioteca Nacional da França. Como se tratava de um documento raro, começou a copiar as partes à mão, em tarefa que levaria tempo incalculável. Até que uma funcionária condescendente da biblioteca autorizou uma reprodução mecânica da partitura. Quando as partes chegaram via Fedex, encontramos outro desafio: montar (em menos de uma semana) um quarteto de cordas segundo o relato de Martius: com uma rabeca. Finalmente, a parte do segundo violino coube a José Eduardo Gramani, professor da UNICAMP, que atacou em sua rabeca alagoana o Quarteto nº 1 de Playel. E a gravação se fez.

Os dez episódios (divididos em 13 programas) foram criados a partir de cada tomo dos livros. E agora podem ser re-escutados em sequência.

Boa viagem!

Julio de Paula

Ouçam a viagem aqui

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