Sigilo em escritura pública

Pedido de Providências – RCPN e Tabelião de Notas – F. M.

“O conteúdo das informações contidas na escritura pública (…) não são únicos ou atípicos, sendo comuns em outros atos notariais a exemplo das escrituras públicas de separação, divórcio e inventário.”

VISTOS, Trata-se de pedido de providências requerendo sigilo em escritura pública de declaração na qual constaram dados financeiros, bancários e patrimoniais do declarante em conformidade a seu direito à privacidade (a fls. 01/39).

O Sr. Interino prestou esclarecimentos à fls. 44/45. Entrementes houve interposição de recurso da decisão liminar que indeferiu a limitação da publicidade do ato notarial (a fls. 40/41 e 46/62).

O Sr. Requerente reiterou suas proposições anteriores (a fls. 65/66).

O Ministério Público apresentou parecer no sentido do indeferimento do requerimento (fls. 70/72).

É o breve relatório. Decido.

A estrutura e função dos serviços notariais é voltada ao livre acesso do conteúdo do acervo das serventias extrajudiciais. O Artigo 1º, da Lei nº 8.935/1994 estabelece: Art. 1º Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.

Esse regramento encerra o Princípio da Publicidade, cujas exceções (sigilo) são expressamente previstas na legislação. O Sr. Requerente, com a finalidade de produzir prova em processo judicial, efetuou escritura pública de declaração por meio da qual mencionou dados patrimoniais e outras questões de seu interesse. No momento da prática do ato notarial (06/10/2020) não houve qualquer indicação acerca do sigilo ou limitação das informações pelo Sr. Declarante.

Nessa perspectiva, ausente qualquer vício, não seria possível àquele venire contra factum proprium (N.E.1), pena de caracterização do comportamento contraditório.

Noutra quadra, inexiste norma jurídica de ordem pública impeditiva da realização da escritura pública como livremente realizada. As questões atinentes ao Artigo 46 da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) estão atendidas, de modo específico, pelas previsões contidas no Provimento CGJ nº 23/2020, conforme bem destacado pelo i. representante do Ministério Público.

Além disso, a LGPD deve ser interpretada em conformidade à publicidade ínsita aos atos notariais, assim, a situação descrita nos autos não se refere ao tratamento de dados pessoais e sim à publicidade da escritura pública em si. O conteúdo das informações contidas na escritura pública objeto deste expediente não são únicos ou atípicos, sendo comuns em outros atos notariais a exemplo das escrituras públicas de separação, divórcio e inventário. Nesse quadro, ausente norma jurídica que permita excluir ou limitar a publicidade da escritura pública validamente realizada, não é possível atender à pretensão do Sr. Requerente.

Ante ao exposto, indefiro o pedido de sigilo total ou parcial da escritura pública de declaração objeto deste processo administrativo.

Ciência ao Senhor Interino e ao Ministério Público.

Encaminhe-se cópia desta decisão à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo a presente sentença como ofício.

P. I.


Adv: Eduardo Diamantino Bonfim e Silva (OAB 119.083/SP) –

Processo 1117659-09.2020.8.26.0100. Acervo INR – DJe de 10/02/2021–SP.

logo_inrDecisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR

Notas do editor:

(1) Inadmissível, já que o direito não socorre a própria torpeza.

O texto acima não substitui o publicado no D.O.E., ao qual os interessados devem reportar-se.

Confiram também: sentença da lavra do MM. Juiz Corregedor Permanente da Comarca de São José do Rio Preto, Dr. Lincoln Augusto Casconi, sobre o tema:

“Os Oficiais de Registro de Imóveis atuam apenas por delegação do Estado, por meio do Poder Judiciário… e, por isso, exercem atividade pública. Logo, nessa função não podem negar-se, no exercício dela, a fornecer certidões com as descrições completas…”

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