SÚMULAS
DO STJ – SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA:
Súmula
364 –
“O CONCEITO DE IMPENHORABILIDADE
DE BEM DE FAMÍLIA ABRANGE TAMBÉM O IMÓVEL PERTENCENTE A
PESSOAS SOLTEIRAS, SEPARADAS E VIÚVAS.”
Comentário:
Súmula expande a proteção dada ao bem de família
a pessoas solteiras, separadas e viúvas.
Nova súmula,
a de número 364, aprovada pela Corte Especial ampliando os casos em que
se pode usar a proteção do Bem de Família. Criado pela Lei
nº 8.009 de 1990, o Bem de Família é definido como o
imóvel residencial do casal ou unidade familiar que se torna impenhorável
para pagamento de dívida.
O projeto 740,
que deu origem à nova súmula, foi relato pela ministra Eliana
Calmon e estendeu a proteção contra a penhora para imóveis
pertencentes a solteiros, viúvos ou descasados. Entre os precedentes da
súmula 364 estão os Recursos Especiais (Resp) 139.012, 450.989,
57.606 e 159.851.
O Resp 139.012,
o relator, ministro Ari Pargendler considerou que o imóvel de uma pessoa
ainda solteira no momento em que a ação de cobrança foi
proposta e que veio a casar-se depois era protegido contra a penhora. O
ministro considerou que no momento da penhora já haveria uma unidade
familiar no imóvel, justamente o alvo da proteção do Bem
de Família.
Já em
outro recurso, o 450989, o ministro aposentado Humberto Gomes de Barros destaca
que a Lei nº 8.009 não visa apenas à proteção
da entidade familiar, mas de um direito inerente à pessoa humana: o
direito a moradia. Nesse processo, uma pessoa residia sozinha no imóvel,
não tendo sido considerada protegida pela 8.009. No entendimento do ministro
relator, entretanto, a proteção deve ser estendida para esses
casos.
Fonte: http://www.stj.gov.br
Data de Publicação: 15.10.2008
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos
de APELAÇÃO CÍVEL Nº 990.10.027.101-6, da
Comarca da CAPITAL, em que é apelante RUBENS JOSÉ PALMA
e apelado o 5º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS da
referida Comarca.
ACORDAM os Desembargadores do Conselho
Superior da Magistratura, por maioria de votos, em negar provimento ao recurso,
adotados os fundamentos constantes dos votos do Desembargador Relator designado
e do Desembargador Revisor que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado. Vencidos os Desembargadores Munhoz Soares e Maia da Cunha.
Declarou voto o Desembargador Munhoz
Soares.
Participaram do julgamento os
Desembargadores VIANA SANTOS, Presidente do Tribunal de Justiça, MARCO
CÉSAR, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça, MUNHOZ
SOARES, Corregedor Geral da Justiça, REIS KUNTZ, Decano, CIRO
CAMPOS e MAIA DA CUNHA, respectivamente, Presidentes da
Seção Criminal e de Direito Privado do Tribunal de
Justiça.
São Paulo, 14 de setembro de 2010.
(a) LUIS GANZERLA, Relator Designado
V O T O
REGISTRO DE IMÓVEIS -
Instituição de bem de família - Princípio de
instância - Aspecto material - Correlação entre
pretensão registrária (extraída da
apresentação contextualizada do título),
qualificação e inscrição predial -
Imperfeição da escritura pública - Falta de indicação
da entidade de família beneficiada - Elemento essencial do ato notarial
- Suprimento por declaração complementar, expressa em instrumento
particular - Inadmissibilidade - Falta de comparecimento e anuência daquele
que o instituidor afirma manter união informal, figurante
necessário - Unitas actus desrespeitada - Registro
inadmissível - Apelação não provida.
1 - Instituição de bem de
família, sob pretensão registrária no escopo de beneficiar
entidade coletiva (união homossexual) não autoriza
qualificação e registro de bem de família para tutela de
pessoa singular, ante o princípio de instância, em seu aspecto
material, a exigir correlação.
2 - Rogação de bem de
família voluntário, em benefício de entidade coletiva
informal, reclama, na escritura pública (título),
especificação da entidade de família beneficiada, elemento
essencial do ato notarial, que não se pode suprir por
declaração complementar, expressa em instrumento particular, bem
como comparecimento e anuência daquele que o instituidor afirma manter
união informal, observada a unitas actus.
Trata-se de apelação
interposta por Rubens José Palma (fls. 30/36) contra a r.
sentença (fls. 27/28) que julgou procedente a dúvida suscitada
pelo 5º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital e,
portanto, negou o registro de instituição de bem de
família na matrícula 36.894, por não ser outorgada por
cônjuges ou por entidade familiar.
A rogação de registro foi
expressa com a apresentação de escritura pública de
instituição de bem de família acompanhada de
declaração, em instrumento particular, de convivência
homossexual, sob prenotação nº 222757.
Objetiva o apelo a reforma da r.
sentença, para improcedência da dúvida suscitada e registro
pretendido.
Sustenta ter havido, pela recusa de
registro ao tempo de apresentação anterior da escritura
pública (prenotação nº 219638), ofensa à Súmula nº 364 do Superior
Tribunal de Justiça, que estende o conceito de impenhorabilidade do
bem de família ao imóvel de propriedade de pessoas solteiras,
separadas e viúvas. Então, em reapresentação do
título, alega nova ilegalidade da recusa de registro, pois há
cerca de 10 (dez) anos mantém relação homoafetiva,
residindo o casal no imóvel objeto da instituição do bem
de família há mais de 5 (cinco) anos, configurando entidade
familiar, anotada, ainda, a necessidade de resguardar o direito constitucional
de moradia e que a família heterossexual não é
distinguível da homossexual pela Constituição Federal.
Recebido o recurso em seus regulares
efeitos (fls. 38), a D. Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo
seu improvimento (fls. 43/46).
É o relatório.
De plano, observe-se a necessária
correlação, em sede de bem de família voluntário,
entre a rogação, a qualificação registrária
e o eventual registro delas decorrente: aspecto material do princípio de
instância.
Pretendido, pois, registro de bem de
família no escopo de beneficiar conviventes de união homossexual,
não se pode determinar registro de bem de família de exclusiva
tutela da pessoa solteira do instituidor.
Embora sem rigidez formal, nosso sistema
registral imobiliário acolhe o princípio de rogação
ou de instância (art. 13, II, da Lei nº 6.015/73) e recepciona a
petição de registro stricto sensu na mera
apresentação do título para o registro: “... o fato
é que apenas ut pluribus a recepção dos
títulos se confunde com a instância de seu registro. É que
o direito normativo vigente reclama, para a averbação,
requerimento do interessado, com firma reconhecida (par.ún., ao art. 246,
da Lei 6015, de 31.12.1973), mas, quanto ao registro stricto sensu,
basta a apresentação do título, contanto que não se
excepcione a intenção registral” (RICARDO DIP, Sobre
a qualificação registral. In Registro de Imóveis
(vários estudos). Porto Alegre: IRIB-safE, 2005, p. 195).
Se a “apresentação do
título subentende ou implica o requerimento de
inscrição” (AFRÂNIO DE CARVALHO, Registro
de Imóveis, 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 270),
é no contexto desta apresentação que se deve extrair a
pretensão de registro. Em outras palavras, porque “é
necessário apresentar o documento em que se fundamente o direito que se
pretende publicar” (MOUTEIRA GUERREIRO, Noções de
Registro Predial, 2ª ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1994, p. 128) e
porque, em nosso sistema, tal como no sistema espanhol, a
apresentação do título, em si, é
“circunstância que exterioriza a petição” (ANGEL
CRISTÓBAL MONTES, Direito Imobiliário Registral. Porto
Alegre: IRIB-safE, 2005, p. 277), sabe-se qual é a rogação
de registro (e, dela, o direito que busca ver publicado) no exame conjugado de
todos os documentos apresentados para o registro, atento não só
ao principal (título), mas também ao acessório (de
função complementar).
No caso, o apelante expressou sua
pretensão de registro de bem de família no universo de
união homossexual com terceiro (e não como solteiro): apresentou,
para o registro, não apenas a escritura pública em que ele consta
como solteiro e sem especificação alguma da entidade familiar
beneficiada, mas também a declaração de convivência
homossexual. Ainda reiterou essa mesma pretensão registrária na
impugnação (art. 198, III, da Lei nº 6.015/73) e na
apelação (art. 202 da Lei nº 6.015/73).
Houvesse rogação tão
somente para instituição voluntária de bem de
família de solteiro, pelo registro, em benefício exclusivo do
instituidor, bastava apresentar a referida escritura pública (e essa
seria a discussão de admissibilidade, ou não, da
inscrição rogada). Entretanto, porque se roga coisa diversa,
apresentou-se, com aquela escritura pública, manca na
indicação da entidade familiar beneficiária,
declaração complementar, no intuito de se acolher, como entidade
dessa natureza, a união homossexual expressa no documento
acessório. E mais: esta rogação não só
não equivale, mas exclui aquela, porque a abrangência e os efeitos
jurídicos de bem de família de entidade coletiva são
diversos daqueles de entidade individual, e, assim, não se pode
aproveitar a rogação de uma para registrar a outra.
Bem de família voluntário
(diverso, na fonte e nos efeitos, do bem de família legal) gera, em prol
da entidade de família coletiva, não apenas impenhorabilidade
(art. 1.715 do CC), mas também inalienabilidade (art. 1.717 do CC),
afetação especial (art. 1.717 do CC), regime de
administração próprio (art. 1.720 do CC) e
projeção post mortem dos efeitos protetivos enquanto viver
um dos cônjuges ou conviventes, ou, na falta destes, enquanto houver
filhos menores ou incapazes (art. 1.716 c.c. art. 1722, ambos do CC),
impossibilitando até o inventário e a partilha do bem (TJSP,
4ª Câmara de Direito Privado, AI nº 512.509.4/6-00, rel. DES.
FRANCISCO LOUREIRO, j. 27.09.2007, com apoio doutrinário em MARIA
HELENA DINIZ, ALVARO VILLAÇA DE AZEVEDO e ZENO VELOSO).
Todavia, na eventual hipótese de bem
de família voluntário em prol de pessoa solteira, considerada
individualmente, seus efeitos são restritos à impenhorabilidade e
à destinação domiciliar do prédio, pois os demais,
a rigor, são próprios de entidade coletiva, que, nesse caso,
não há.
Pretensão de registro de bem de
família em sede de união homossexual, pois, traz consigo a de
publicidade de situação jurídica do bem, suscetível
até de projeção após a morte de um dos conviventes,
na sobrevida do outro, e de óbice à partilha do prédio;
situação essa, na raiz, própria de entidade coletiva, que
não há em bem de família de pessoa solteira, ante sua
tutela singular, individual.
Em suma, ante os registros diversos e
excludentes por incompatibilidade de fins (um no escopo gerador de
benefício comunitário; outro, de benefício individual), a
rogação de um (instituição de bem de família
para tutela de entidade coletiva) não autoriza registrar o outro
(instituição de bem de família para tutela de pessoa singular).
A requalificação, em grau de
apelação, entretanto, não pode ter solução
diversa da negativa do registro pretendido, em razão da
imperfeição do título de instituição de bem
de família (não apontada, na escritura pública, a entidade
familiar beneficiada), que não comporta complemento por
declaração da parte em instrumento particular.
É certo que algumas omissões
dos títulos podem ser supridas por documentos ou
declarações complementares expressas em instrumento particular,
inclusive para atos solenes, em que a escritura pública é da substância
do ato jurídico, mas essa exceção somente é
possível quando não incidir em elementos integrantes ou
essenciais do ato notarial (Ap. nº 2.543-0, rel. DES. BRUNO AFFONSO DE
ANDRÉ, j. 04/08/83, DOE 05/07/83; Ap. nº 73.477-0/5, rel. DES.
LUÍS DE MACEDO, j. 15/02/01, DOE 28/03/01).
Ora, em escritura pública destinada
à instituição de bem de família voluntário,
que é forma substancial do negócio jurídico, a
especificação da entidade familiar é elemento integrante
ou essencial do ato (art. 1.711 do CC).
Assim, instituição de bem de
família por “cônjuges” (sic), aponta
automaticamente para tutela da família constituída pelo casamento
dos instituidores, e, instituição por “entidade de
família” (sic) diversa (v.g. união
estável, família monoparental), reclama sua
especificação na escritura pública.
Afinal, a teleologia do bem de
família voluntário, inserto no título “do direito
patrimonial” do livro “do direito de família”
do novo Código Civil, reside em “garantir um asilo à
família” (ALVARO VILLAÇA, Bem de família,
5ª ed. São Paulo: RT, 2002, p.93), “assegurar um lar à
família” (MARIA HELENA DINIZ, Curso de direito civil
brasileiro, 22ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, v. 5, p. 217; SERPA
LOPES, Curso de direito civil, 8ª ed. Rio de Janeiro: Freitas
Bastos, 1996, v. 1, p. 404), afetar bens “a um destino especial, que
é ser a residência da família” (ZENO VELOSO, Código
Civil Comentado. São Paulo: Atlas, 2003, v. XVII, p. 80; CAIO
MARIO, Instituições de direito civil, 12ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1991, vol I, p. 311); “resguardar o domicílio da
família e da entidade familiar” (MARIANA RIBEIRO SANTIAGO, Da
instituição de bem de família no caso de união
estável.
Revista de Direito Privado nº 18.
São Paulo: RT, 2004, p. 176).
E, assim, “Para que se constitua o
bem de família voluntário, é necessária a
configuração dos seguintes requisitos: propriedade do bem por
parte do instituidor, destinação específica de moradia da
família e a solvabilidade do instituidor” (MARIANA RIBEIRO
SANTIAGO, ob.cit., p. 180).
Logo, abstração à
matéria de admissibilidade, ou não, de bem de família em
união homossexual, manifesta-se, no caso, óbice formal à
pretensão registrária deduzida, pela deficiência do
título de instituição consistente na omissão, no
corpo daescritura pública, da entidade de família beneficiada,
requisito essencial do ato solene, que não comporta suprimento em
instrumento particular complementar.
Outrossim, para além da
indicação da entidade familiar beneficiada, que a escritura
pública omite, seria indispensável, no ato notarial, o
comparecimento, como anuente, daquele que o apelante afirma manter união
informal, pois não se pode interferir na esfera jurídica alheia
sem a aquiescência do outro, que, de certo modo, seria não
só beneficiado com os efeitos do bem de família, mas
também ficaria em estado de sujeição ao que o novo regime
jurídico lhe impõe (v.g. poder-dever de
administração comum do bem de família, salvo
disposição contrária do ato de instituição:
art. 1.720 do CC).
E, nesse particular, a unitas actus,
própria da escritura pública - a exigir a “presença
simultânea dos figurantes”, como “condição sine
qua non de validade do ato” (PONTES DE MIRANDA, Conceito e
importância da unitas actus no direito brasileiro (escrituras
públicas, actos solenes, testamento). Rio de Janeiro: A. Coelho
Branco Filho, 1939, p. 10-11) -, também não está
observada.
Deste modo, embora por fundamentos diversos
da r. sentença, manifesta-se, no caso, a irregistrabilidade do
título, em razão da imperfeição da escritura pública
de instituição de bem de família, omissa em elementos
essenciais para a pretensão registrária rogada (falta de
indicação da entidade de família beneficiada com a
instituição e falta de anuência, no ato notarial, daquele
com quem o apelante afirma manter união informal), questão formal
de precedência lógica à questão material antes
ventilada (admissibilidade, ou não, de bem de família em
união homossexual).
Resultado do julgamento: Nega-se provimento
à apelação.
(a) LUIS GANZERLA, Presidente da
Seção de Direito Público e Relator Designado
V O T O
Com a devida vênia do eminente
Relator, acompanho o voto dissidente do douto Des. Luis Ganzerla.
Não mais se discute o direito
à instituição de bem de família por parte de
solteiro.
Ocorre que, in casu, o registro foi
pretendido visando beneficiar a conviventes em união homossexual, o que
desde logo estaria a exigir a presença na própria escritura
pública, e não por declaração ou
declarações complementares trazidas em instrumento particular,
como aqui sucedeu, de ambos os conviventes, e a menção à
entidade definida como família beneficiada.
Bom lembrar que a anuência do
convivente, na escritura pública, tanto mais se imporia porque a
instituição do bem de família lhe traria ônus
próprios da administração comum, então criada.
Assim, como bem anotado no r. voto do
eminente Des. Luis Ganzerla, não entra em linha de interesse discutir no
caso presente e admissibilidade ou não da instituição de
bem de família em união homossexual.
Em síntese, sigo os argumentos de
tão qualificado voto, dissentindo, com o máximo respeito, da
relatoria originária.
(a) Des. MARCO CÉSAR MÜLLER
VALENTE, Revisor
V O T O
REGISTRO DE IMÓVEIS –
Dúvida julgada procedente – Escritura pública de
instituição de bem de família, com fundamento no artigo
1.711 do Código Civil – Proprietário solteiro –
Admissibilidade – Proteção do imóvel destinado a
finalidade residencial que visa à proteção da
família e da dignidade da pessoa humana – Aplicabilidade da
Súmula nº 364 do Superior Tribunal de Justiça - Recurso
provido.
Trata-se de apelação
interposta contra r. sentença que julgou a procedente dúvida
suscitada pelo Oficial do 5º Registro de Imóveis da Comarca da
Capital e negou registro na matrícula nº 36.894 de escritura de
instituição de bem de família, porque não outorgada
por cônjuges ou por entidade familiar.
O apelante alega que a recusa do registro
da instituição do bem de família contraria a Súmula
nº 364 do Superior Tribunal de Justiça que estende a
impenhorabilidade do bem de família, prevista na Lei nº 8.009/90,
em favor de pessoas solteiras, separadas e viúvas. Aduz que, embora
solteiro, mantém relacionamento afetivo com outro homem, em companhia do
qual coabita há cinco anos, o que originou entidade familiar e sociedade
econômica. Assevera que a instituição do bem de
família resguarda o direito constitucional de moradia. Afirma que a
Constituição Federal não distingue a família
heterossexual da família homossexual. Requer a reforma da r.
sentença para que seja promovido o registro da escritura pública
de instituição do bem de família.
A douta Procuradoria Geral de
Justiça opina pelo não provimento do recurso.
É o relatório.
O apelante institui como bem de
família, com fundamento no artigo 1.711 do Código Civil, o
imóvel objeto da matrícula nº 36.894 do 5º Registro de
Imóveis da Comarca da Capital.
O apelante tem o estado civil de solteiro e
não especificou, na escritura pública apresentada para registro
(fls. 09), a entidade familiar que será beneficiada pela
instituição do bem de família.
Apesar de solteiro, porém,
não há obstáculo à instituição do bem
de família convencional.
A doutrina já admitia que o bem de
família do art. 1.711 do Código Civil fosse instituído por
pessoa solteira, como se extrai das lições de Paulo
Lôbo, Famílias, Saraiva, 2009, p. 381, e Rolf Madaleno, Curso de
Direito de Família, 2008, Forense, p. 381.
Na jurisprudência, a Súmula n.
364 do Superior Tribunal de Justiça consagrou o entendimento de que a
impenhorabilidade do bem de família é assegurada também a
pessoas solteiras, com amparo na Lei n. 8.009/90. Entre os fundamentos que
justificaram sua edição, está o de que “não
faz sentido proteger quem vive em grupo e abandonar o indivíduo que
sofre o mais doloroso dos sentimentos: a solidão” (Milton Paulo
de Carvalho Filho, Código Civil Comentado, Manole, 2009, p. 1.899).
Assim sendo, incompreensível que a
proteção dada pela Lei n. 8.009/90 às pessoas solteiras
não seja passível de instituição por ato
voluntário.
A instituição feita por
escritura não implicará efeito diverso do que se verifica no caso
em que a instituição é feita pelo pai de família e
a restrição prevalece posteriormente em favor de um dos
integrantes da família: viúvo, viúva, filho etc.
Em todas essas hipóteses,
haverá proteção a um dos integrantes da família,
que remanesceu, mas que, nessa ocasião, já não terá
família a proteger.
Por razão equivalente, é
possível compreender, como fizeram a doutrina e a jurisprudência,
que pessoa solteira possa instituí-lo, uma vez que a residência
é protegida como modo de assegurar sobrevivência digna:
“A interpretação
teológica do Art. 1º, da Lei 8.009/90, revela que a norma
não se limita ao resguardo da família. Seu escopo
definitivo é a proteção de um direito fundamental da
pessoa humana: o direito à moradia. Se assim ocorre, não faz
sentido proteger quem vive em grupo e abandonar o indivíduo que sofre o
mais doloroso dos sentimentos: a solidão” (ERESP n. 182.223,
rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 6.2.2002).
Acrescente-se que a
instituição do bem de família por pessoa solteira é
mais conveniente ao interesse de terceiros e eventuais credores, pois
estará contemplada pela publicidade que decorre do registro, ausente no
bem de família legal da Lei 8009/90.
A admissibilidade da
instituição do bem de família por pessoa solteira
também se ampara no fato de que a moradia é direito social
assegurado pela Carta Magna (art. 6º) Constituição Federal,
reforçando a convicção de que a proteção
gerada pelo art. 1.711 do Código Civil deve ser interpretada de modo
extensivo.
Diante do exposto, DÁ-SE provimento
ao recurso.
(a) MUNHOZ SOARES, Corregedor Geral de
Justiça. (D.J.E. de 28.02.2011)
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